Para você que vem
acompanhando nossas postagens, ou você que vai ler pela primeira vez, o texto
de hoje é um pouco diferente do que costumamos contar, ou seja, não vamos
contar sobre uma de nossas passarinhadas, mas de uma experiência que eu NatháliaF. Canassa tive em uma consultoria de ornitologia na Flona do Jamari, na
Cidade de Itapuã do Oeste- RO. Para você não ficar questionando o que uma
mastozoóloga foi fazer em um campo de ornitologia, já deixarei bem claro que
antes estava fazendo consultoria de masto, ou seja, trabalho com mamíferos e me
ofereci para auxiliar o Prof. Dr. Ricardo Krul, Coordenador do Laboratório de
Ornitologia do Centro de Estudos do Mar da UFPR, pois queria conhecer as aves
que habitam o oeste da Amazônia e como uma boa Penelope que se preze, observar vários
bichos e fazer lifers. Enfim, como se
tratava de uma consultoria, tínhamos que seguir uma metodologia. Acordávamos todos
os dias às 4h30min da manhã, e infelizmente nossas trilhas eram distantes de
onde estávamos, então a gente tinha que sair no máximo às 5h, já que nosso
trabalho tinha rendimento das 6h da manhã até às 10h. Os horários para mim eram
o de menos, pois eu só torcia para que no meio do caminho víssemos uma onça-pintada
(Panthera onca). Conseguimos ver
apenas um dia de tarde quando fomos pescar, passando correndo na nossa frente, mas
uma pena, pois não deu para fotografar. Durante a amostragem, o Prof. Dr.
Ricardo gravava as vocalizações dos bichos e anotava na caderneta, enquanto me
ensinava os nomes científicos e os cantos para eu aprender. Ouvimos bastante os
cantos do chororó-negro (Cercomacra nigrescensis),
do capitão-do-mato ou cricrió (Lipaugus
vociferans), surucuá-de-barriga-amarela
(Trogon rufus), surucuá-de-cauda-preta
(Trogon melanurus), surucuá-de-barriga-vermelha (Trogon curucuí) e mais um monte que não me recordo. Com toda minha
experiência em “ornito”, ou seja, nenhuma, eu ficava prestando atenção para que
no próximo ponto eu pudesse ajudar, mas o máximo que eu conseguia fazer era
dizer “esse canto eu ouço bastante quando estou fazendo censo” ou “esse eu já
ouvi também, parece um que tem lá na Paraíba” (obrigada meninas pelas
passarinhadas, vocês eram sempre lembradas) ou “mentira que esse canto é desse
bicho, sempre que ele canta me assusta ou assusta meus bichos, os mamíferos”.
Um exemplo é com o udu-de-bico-largo (Electron
platyrhynchum)), pois eu sempre queria saber que bicho era esse que ficava “udu...udu...”
e como eu tinha raiva dele.
udu-de-bico-largo (Electron platyrhynchum)
Quando tive a
oportunidade de vê-lo, não esperava que fosse tão bonito e finalmente havia
conseguido a foto de uma ave. Não ficou do jeito que eu gostaria, mas valeu o
registo (eu acho). Além de tentar ajudar através das vocalizações, eu queria
mesmo era ver as aves, então, sempre que via algo voando sobre a minha cabeça,
eu ia na mesma direção e acabava não vendo. Nunca vi bichos tão difíceis de serem fotografados. Isso às vezes me irritava, no entanto, eu não
podia esquecer que quem estava do meu lado era um ornitólogo e toda vez que o Ricardo
ouvia um bicho bonito ou uma ave diferente, que seria ótimo para tirarmos uma foto,
ele usava o playback. Lembro que o primeiro bicho no primeiro dia que respondeu
bem, mas fez a gente de “bobo”, foi o surucuá-de-barriga-amarela (Trogon rufus), cuja foto ficou linda #SQN,
só apareceu a barriga dele #chatiada. Por outro lado, teve um dia que o papa-formiga-pardo (Formicivora grisea), depois de uma
hora (não estávamos mais no horário de trabalho) deixou a gente fotografá-lo, só
que a foto ficou mais ou menos. Já para outras aves nem foi
preciso muito esforço, como a ariramba-do-paraíso (Galbula dea), que de tão quietinha que ficou, permitiu muitas
fotos e o meu “mas” de agora é que o céu estava horrível, na verdade, minhas
fotos só não ficaram melhores por conta do tempo, todos os dias nublados.
papa-formiga-pardo (Formicivora grisea)
ariramba-do-paraíso (Galbula dea)
Nessa consultoria eu creio
ter começado a gostar de pica-paus. Acho que foi porque era o único bicho que
eu sabia quem era, por estar ali apenas “bicando” o tronco de uma árvore, sabia
que era um pica-pau, mas não sabia qual pica-pau era. Daí, eu sempre ia procurar
em qual árvore ele poderia estar para eu poder vê-lo, e como sempre era em vão,
eu chegava a ficar com dor no pescoço de tanto que olhava pra cima, até não
escutar mais as batidas no tronco. Na sequência, eu ouvi um canto, eu olhei para
o Ricardo e disse “que ave é essa? A gente ainda não ouviu né?” e simplesmente ele
respondeu: “Já sim! É o fulano (só que em nome científico), aquele pica-pau que
você estava procurando”! Lá ficava eu com cara de tacho, mas tudo bem, pelo
menos acho que era empolgada. Enquanto o Ricardo ficava gravando, o silêncio
era crucial, na verdade era para ser. Às vezes eu não percebia que ele estava
gravando e ficava procurando alguma ave diferente em um local bacana para que
eu pudesse fotografar. Quando eu via uma, meus olhinhos brilhavam, sorrisão na
orelha e dizia: “Ricardo, estou vendo aquele que você me disse” ou “eu viii,
ele é pretinho” ou “esse eu nunca vi, que bicho é esse?” Como vocês podem ver,
eu não falava os nomes das aves, nem o popular e muito menos o científico, acho
complicado. Na verdade, são piores que os nomes científicos de mamíferos, porém
um ou outro eu sabia, como o chora-chuva-de-cara-branca (Monasa morphoeus) e o chora-chuva-preto (Monasa nigrifrons), essas duas espécies de tanto que a
gente vê, consegui aprender a identificá-los. Se fossem animais terrestres a gente
andava chutando. As araras-canindé (Ara ararauna), danadas, que às vezes me
davam susto ou atrapalhavam as gravações, pior do que eu. O gavião-pedrês (Buteo nitidus), pois todo
gavião que eu via, eu falava que era ele e a maioria era, acho que ele me
perseguia, por isso se tornou meu xodó, ainda não consigo distinguir o canto de
um gavião para outro, para mim ainda continua a soar tudo igual. O último que
eu me lembro de saber dizer tanto o nome popular quanto o científico é a
rendeira (Manacus manacus), na hora
só soube dizer quem era pois estavam fazendo lek e olha aí as Penelopes me
ajudando mais uma vez. Aprendi em uma passarinhada na Mata do Pau Ferro. Mais
uma vez eu agradeço e como sempre, SEM FOTO, o mutum cavalo (Pauxi tuberosa), o jacu-de-spix (Penelope jacquacu) e o jacamim-de-costas-verdes
(Psophia viridis). Esses três eu sou
obrigada a saber, pois anotamos eles em censo, e na estrada mesmo a gente
consegue ver. O mutum é folgado, não sai da frente do carro por nada, o jacu
escandaloso dá susto (eu levo muito susto), o jacamim é mais difícil de ver,
mas um dia uma família ficou passando na nossa frente na estrada, só que
rápido, ou seja, minhas fotos ficaram embaçadas. Vimos então minha dificuldade,
mas com duas espécies tentei fazer associações para pelo menos lembrar o nome
científico, no caso do inhambu-relógio (Crypturellus
strigulosus), falava para
o Ricardo “esse não é aquele faminto?” e o outro foi com o cantador ocráceo (Hypocnemis
ochrogyna) que não vou falar, pois é uma associação que
não é permitida no blog, mas deixo para vocês imaginarem.
chora-chuva-preto (Monasa nigrifrons)
gavião-pedrês (Buteo nitidus)
Como estávamos em uma área enorme, com “muuuita” coisa para se ver,
sempre depois do trabalho feito íamos para algumas áreas diferentes fazer o quê?
Pescar! Como é bom pescar, eu ficava horas e horas e não pescava nada, para não
dizer que não consegui pegar um peixe, pesquei uma piranha e um tucunaré
mirrado, em um dia, por que no resto não vou nem comentar. Já o Ricardo, ele
não passa fome. Ao todo ele deve ter pescado uns oito ou mais peixes. Além de
pescar, passarinhávamos. Um dia, antes de pescarmos, fomos passarinhar e foi o
caso quando conseguimos altas fotos do xexéu (Cacicus cela) com um ninho. O azar foi que não conseguimos tirar foto dele alimentando o
filhote. Curió (Sporophila angolensis), garça branca grande (Ardea
alba) e até jacaré. Durante as pescarias era
possível ver o gavião-belo (Busarellus nigricollis) , gavião de anta (Daptrius
ater), anu preto (Crotophaga ani), sete-cores-da-amazonia (Tangara
chilensis), pipira-vermelha (Ramphocelus carbo), pato-do-mato (Cairina
moschata), periquitão maracanã (Psittacara leucophthalmus), quero-quero
(Vanellus chillensis), tucano grande do papo grande (Ramphastos
tucanus ), urubu de cabeça preta (Coragyps atratus), maria
da praia (Ochthornis littoralis) , não tínhamos preocupação com a hora e nem com o tempo de permanência.
Esses eram os melhores momentos, quando eu conseguia visualizar muito mais aves.
Bati muuuito mais fotos e altos lifers (na verdade todas as aves que eu
via eram lifers). O melhor de tudo é que eu também via mamíferos, como o
porco-do-mato (Pecari tajacu,)
bandos de macaco de cheiro (Saimiri ustus), zogue-zogue (Callicebus
brunneus), esquilo (Urosciurus spadiceus), ariranha (Pteronura
brasiliensis). E o mais lindo de todos (quando eu disse que estava
apaixonada por pica-pau não era brincadeira). Em um domingo de manhã,
passarinhando eu e o Ricardo, fomos cada um para um lado, por que eu fui para o
outro lado? Ouvi um pica pau *-*, estava eu linda, com a cabeça para cima, a
boca aberta, procurando o pica-pau, de repente, um matinho se mexe na minha
frente, eu congelei na hora e fiquei olhando uma lindeza a uns três metros de
mim, me olhando de volta, adivinhem só? Uma Panthera onca (onça
pintada), NÃÃÃÃÃÃÃÃÃO, não era, queria eu que fosse, além de congelada eu estaria
toda trêmula, mas era um lindo cachorro do mato (Cerdocyon thous), conhecido como raposinha. Ele andou na minha frente, parou e fez pose, eu
ficava olhando com cara de apaixonada e foi lindo, eu ganhei meu domingo, não
queria saber de mais nada. Eu amei estar em campo observando aves, tirando fotos,
conhecendo os cantos, vendo que existem passarinhos tão mirradinhos com um
canto muuuuuito louco e que acabam te encantando. Mas puxarei sardinha para o
meu lado, toda vez que eu via algum mamífero, tanto na trilha quanto nas
passarinhadas, eu perdia meu foco e ficava lá tirando fotos ou tentando tirar
as fotos, rsrsrsrs.
xexéu (Cacicus cela)
Jacaré
quero-quero (Vanellus chillensis)
maria da praia (Ochthornis littoralis)
cachorro do mato (Cerdocyon thous)
Vídeo com algumas fotos das passarinhadas
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